A HORA DE DESLIGAR A CÂMERA
Ontem pela manhã participei como convidado (obrigado mestres e alunos que me chamaram) da Semana de Jornalismo da Puc paulista. Meus companheiros de mesa eram o jornalista e blogueiro (idealizador do bom site "repórter Brasil") Leonardo Sakamoto e o fotógrafo João Zinclar que está lançando um belíssimo livro sobre o rio São Francisco cuja capa está na foto acima. Todos nós estávamos ali para falar do espinhoso tema "Liberdade do Jornalismo".
Vou poupar a distinta audiência de minhas opiniões sobre o tema até porque não acredito que jornalista algum tenha liberdade total a partir do momento que está sempre a serviço de alguém. A não ser, é lógico,que se dê ao trabalho de manter um blog como esse, fora de portal, nesse universo atomizado da internet onde pode dizer o que pensa e receber modestas porém sempre fiéis visitas.
Isso posto o debate/conversa rolou leve e solto e só depois de ir embora me dei conta do quão legal foi uma pergunta que recebi de uma jovem estudante de jornalismo ; se alguma vez eu desliguei a câmera da televisão e deixei de registrar um fato para ajudar e ser apenas um cidadão.Pensei um pouco e lembrei então de um fato tocante que aconteceu comigo e a equipe do programa "Caminhos e Parcerias" ( TV CULTURA) que então eu dirigia. Estávamos no norte de Minas, cercanias de Montes Claros, ano de 2001. Gravávamos um episódio sobre a atuação da Pastoral da Criança ali naquele pedaço árido e cheio de miséria à beira do vale do Jequitinhonha. Nos deparamos com uma favela fragílíssima , a maioria dos barracos erguidas de tábuas leves e folhas de papelão embaixo de gigantescas e perigosas torres de alta tensão. Seguíamos com a porta da van aberta quando registramos em "travelling" o triste movimento de tristeza e apatia dos moradores daqueles casulos. Gente mal tratada e puída sob um sol escaldante. De repente estancamos diante de uma das barracas onde uma mulher negra e desgrenhada rodeada de muitos filhos nos olhava sem nos ver. Adiante dele um dos seus filhos menores, no chão batido de terra. Menino feio, ranhento, barrigudo de verminoses e choroso. A fome era tanta que ele chupava uma pedra. Nunca enquanto eu viver esquecerei esse menino triste chupando uma pedra. Registramos essa cena mas não tive coragem de usá-la. Tem hora que é simplesmente hora de desligar a câmera. Ficamos tão atordoados que por iniciativa de minha amiga , a eficiente produtora Alessandra Valenti, saímos dali fomos até Montes Claros e fizemos uma compra para aquela família miserável . Com a nossa grana e não com a verba de produção. Ao voltarmos com o farnel a surpresa foi ver a mulher com seu sorriso timido ao ver a compra chamando a vizinhança para repartir o que recebia. Num único dia aprendi uma porção de lições. Que vocês podem imaginar bem quais sejam.
Comentários
Muita saudade de vc meu querido e amado amigo.
Estou te seguindo aqui com o meu blog, o Declarando.
Adoro seus textos e sua LIBERDADE aqui :-)
Ótima iniciativa.
Grande beijo.
Ana... obrigado por tudo. Por ontem, pelo convite e pela gentileza em acompanhar o meu blog... bj pra vc tb...