AINDA DE NAMORO COM A COMUNICAÇÃO PÚBLICA
Estou
de volta à comunicação pública mas se for pensar melhor acho que
dela pouco sai desde que no começo de 1988 entrei para a Tv Cultura
de São Paulo para tomar parte do grupo que inventou o programa
“Metrópolis” do qual fui o primeiro apresentador.
Não
é necessário aqui alinhavar quantas são as diferenças entre a
comunicação pública e a privada e a má vontade que a mídia em
geral tem com a primeira. Basta ver a pauta de televisão que a
“grande mídia” considera relevante, sempre eivada dos engasgos
criativos dos diretores globais e seu exército de péssimos atores e
atrizes transformados em celebridades. A Globo pauta a mídia
televisiva e os “colunistas” e isso é mais do óbvio. Tão óbvio
quanto dizer que a mídia que cobre televisão não se importa muito
( quase nada) com a comunicação pública preferindo taxá-la de
“chapa branca” , “audiência zero” ao invés de se debruçar
sobre a grade de programação dos canais não comerciais e aí
pinçar, eu garanto, conteúdos muito melhores do que o ofertado pela
comunicação privada.
Para
os que “cobrem” televisão é como se a TV pública não
existisse, como se ao possuírem audiências baixas ninguém
estivesse vendo o que produzem. O que não é verdade. A TV pública
brasileira se não se constitui um modelo de excelência está longe
de ser péssima como querem fazer crer os ignorantes que não a
assistem mas que não se constrangem em dizer que ela é ruim.
Eu
acredito na tal “missão” da TV e da comunicação pública que é
levar conteúdo de excelência a quem não pode ter acesso a TV a
cabo ou está se fartando desse modelo hediondo da TV comercial
pautado em novelas ruins, jornalismo pasteurizado ou encharcado de
sangue, violência no atacado e varejo e culto a celebridades
inócuas.
A
TV comercial aberta nunca foi tão ruim quanto é hoje e nem assim a
mídia que cobre TV parece disposta a dar mais espaço ao que fazem
as emissoras públicas de todo o país que , quando entram em pauta,
é só se fazer especulações políticas sobre as suas políticas e
nunca para avaliar para o que de fato estão ofertando. E olha que
não falo apenas dos conteúdos veiculados pela Tv Cultura de São
Paulo ou da TV Brasil mas também do que é feito pela Rede Minas,
TVE da Bahia , Tv Aperipê de Sergipe, TVE do Rio Grande do Sul, Tv
Antares do Piauí e por aí adiante.
Colocaram
a pecha de que TV pública é Tv chata quando não Tv chapa branca,
do governo e demais variações do tema. Quem assim rotula , na
maioria , é do time do “nunca vi mas não gostei”. Basta ver o
simplismo de alguns “articulistas” ( na verdade meros
mexeriqueiros) que se referem a Tv Cultura de São Paulo como “a Tv
dos tucanos” e a Tv Brasil como “a Tv do PT”. Só isso revela
o tamanho da ignorância a respeito sobretudo pela enorme confusão
que ajudam a difundir não explicando as grandes diferenças que
existem entre os conceitos de Tv pública e Tv estatal.
Mas
essa é uma prosa que eu já desisti de debater porque os argumentos
contrários são cegos e estão partidarizados. Só posso lhes
garantir que eles estão nublados pelos preconceitos. Por outro lado
algumas emissoras públicas , talvez intimidadas pelo não
reconhecimento se recolhem a fórmulas prontas e deixam de investir
na ousadia e na renovação de formatos repetindo fórmulas já
gastas da TV comercial se esquecendo de um passado glorioso quando
saltavam à frente na experimentação de novas linguagens como bem
ilustram ( só para ficar no caso da Tv Cultura de Sp) os programas
“Vitrine”, “Zoom”, “Fábrica do Som”, “Vitória”,
“Roda Viva” e o já citado “Metrópolis”.
Eu
continuo a acreditar na comunicação pública de qualidade, em uma
TV pública presente em todo território nacional difundindo
linguagens de tons diversos, sotaques distintos do eixo Leblon-
Jardins . Creio no modelo de negócio que seja menos negócio e mais
atenção ao telespectador. Que não o subestime e não creia que ele
é um descerebrado que não come biscoito fino. Ou, ainda acredito,
num modelo de comunicação pública que use inclusive dos signos da
comunicação popular com conteúdo educativo sem ser refém dos
“pedagogismos” acadêmicos que tanto solapam os debates sobre
comunicação pública. Por que não um “Datena do bem” ? , um
Marcelo Rezende que não viva só dos sensacionalismos baratos ?.
Os
gestores da comunicação pública brasileira tem uma
responsabilidade imensa. A de atrair um público cansado da mesmice
para a sua causa. E isso é ainda mais difícil nessa época de
internet turbinada e aplicativos de toda ordem. Sem falar do Youtube
e congêneres. Se pensarmos que estaremos agregando e não
concorrendo será mais fácil . Se nos apegarmos ao que deu certo na
TV comercial e adaptarmos à realidade da TV pública eu boto fé no
futuro. Sem preconceito nas também sem “babação” ao padrão
global. Me incomoda em rodas de discussão de comunicação pública
citarem a Globo como padrão a ser seguido sem levar em conta a
situação, época e contexto em que foi erguida e consolidada com
um deslumbramento que coloca num panteão ex- dirigentes globais como
Boni, Walter Clark e Daniel Filho. A competência deles foi inegável
mas não serve de parâmetro para a TV pública que ainda está na
pré-história de sua identidade.
Talvez
hoje a TV Globo e suas imitadoras ( limitadoras ?) tenham mais a
aprender do que imaginam e como vimos recentemente quando foi surrada
na praça de Recife e Pernambuco quando a Tv Brasil resolveu exibir
os jogos da série C do Campeonato Brasileiro do qual a Globo ficou
fora. Exceção ? Sim , com certeza. Mas exceções podem ser regras
sobretudo quando prova que nem sempre o padrão global é infalível.
Confundida apenas como
“chapa branca” pela evidente má-fé de muitos que refletem sobre
o tema a comunicação pública, sobretudo a TV, tem que ser uma
rebelde com causa e não uma criança acuada pelos gigantes do deus
-mercado. Por tudo isso e apesar das muitas dificuldades eu ainda
creio muito na comunicação pública onde direta e indiretamente
estou há 26 dos meus 37 anos como profissional do ramo.
Ricardo Soares
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