DEITADO NO SOFÁ DE CURVIM
Envelhecer desse jeito sem ter ousado me parece algo
muito triste e é assim que me vejo se tivesse envelhecido na quente noite de
verão onde evitei um contato visual, corporal ou verbal com desconhecida. Me vejo assim a buscar sôfrego o
ventinho tímido do ventilador, a ansiar por compressas nas costas e mesmo por
uma boa noite de sono sem as muitas pausas para as micções.
Vejo como é pouca a
felicidade e o quanto nos contentamos pouco com ela a essa altura desse campeonato onde senhora alquebrada e com as pálpebras cansadas busca um sentido feminino para as suas
apreensões e rugas fartas. Sou um velho e estou deitado ao lado de uma
velha que logo mais vai ranger os
dentes e passar meia dúzia de cremes que de nada servirão para despistar a sua
decrepitude. Ela pode ter em mente algum dia dançante mas ele já era. Ficou
escorregadio imprensado entre impurezas das recordações que ganham contornos
irreais e próprios conforme as lembranças vão ficando mais longínquas . Afinal
, o que se ouvia então ? qual a canção que marcou nossa vida ? Por que ela
sempre esqueceu as letras das músicas ? Por que sequer a memória dela é
seletiva ? Porque ela só retem lembranças amargas. Eu me lembro que a cerveja
era quente , doía meu dente e deitado num sofá de curvim eu garantia que todas
essas lembranças eram lambanças.
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