ENTRE DALAI LAMA E O BOCA DO INFERNO
Sinceramente nesses tempos de prosas, versos, insultos e afagos virtuais às vezes me penitencio e me pergunto se peso a mão em alguns comentários, posts e crônicas que faço por aí .Sim, acho que sim. E isso pode muitas vezes ofender a alguns "elegantes" que se sentem ofendidos com epítetos maliciosos, sarcasmos ou mesmo ironias. Afinal vivemos tempos politicamente corretíssimos. Por isso passo a maioria das vezes na paz do senhor virtual .Mas tenho minhas bruscas recaídas quando a revolta revolve o estomago. O paradoxo é que se pede fairplay diante de absurdos mas nunca as pessoas se ofenderam tanto umas às outras e não só virtualmente. A gente fica dividido entre ser educado, elegante e espremido diante da parede da indignação diante de tantos abusos , roubalheiras e cafajestadas no plano nacional e internacional. Aí um lado meu quer ser Dalai Lama e outro não resiste a ser Gregório de Matos e aí, aviso aos navegantes, nem de longe estou querendo me comparar a um gênio da poesia brasileira e não só satírica.
Gregório de Matos Guerra nasceu na Bahia, em 1633, e morreu em Recife em 1696. Estudou em Portugal para onde sua família o mandou saber das leis na Universidade de Coimbra bem antes de ficar conhecido pelo epíteto de "Boca do Inferno". E tanto lá quanto cá fez inimigos terríveis e ferozes por seu enorme talento satírico. Se meteu em tantas embrulhadas que acabou por ser degredado para Angola. Seu poema "Verdades Miúdas", antológico e fundamental para quem pretende conhecer literatura brasileira, não é apenas um primor da sátira. Teria influenciado inúmeros cantadores do Nordeste por anos a fio e , convenhamos, nesses nossos tempo está mais atual do que nunca. Por conta de tanto palavrório hipócrita, de tanta gente dissimulada e cínica que se ofende por meia dúzia de ironias creio que faz a maior falta um Gregório de Matos hoje em dia quando o máximo de acidez que conhecemos são as brincadeirinhas do "Porta dos Fundos" ou as graças do "Sensacionalista " que, aliás, aprecio. Mas é pouco quando lembramos do "Boca do Inferno". Vejam só se alguns trechos ( como os que transcrevo abaixo) não cabem perfeitamente no noticiário atual quando abjetos Cunhas , Renans e Marins da Fifa dão o tom da escrotidão vigente :
Ouvi, amigo João,
Esta verdade que canto;
Se a verdade causa espanto,
Esta causa admiração :
É certo e sem omissão,
E contra isso não há nada
Que esta é a verdade usada;
E a de rebuço e de engano
É verdade de magano;
E esta é de gente honrada.
(...)
Amigo, que aqui vos digo,
São as de que sou amigo; - ...
O mais são só asnidades
Desses que dizem rodeios;
Porque só por esses meios
Se fala bem português;
Tudo o mais é ser francês,
E trazer na boca freios.
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