EU CONHECIA BENTO RODRIGUES
A tragédia lembra a da cidade colombiana de Armero que foi soterrada pelas cinzas e lama do vulcão Nevado del Ruiz. |
O desastre em Bento Rodrigues. Difícil não fugir do assunto muito
embora talvez não tenha muito a acrescentar a indignação coletiva. É fácil
amarrar as pontas mas difícil aparar as arestas. Embora sejamos um país
com ânsia “jeca” de ser “primeiro
mundo” seguimos em um subdesenvolvimento
atroz que optou pelo modelo desenvolvimentista sempre com pesos e medidas que
nunca pendem para o lado dos pagadores de impostos, os cidadãos comuns, o bem
estar coletivo. Não somos os únicos nisso mundo afora mas nos esmeramos para
sermos os piores com nossos constantes descasos com o meio ambiente, a saúde, a
mobilidade.
Conheço (ou conhecia) Bento
Rodrigues. Desde 1978 quando meu falecido pai se mudou para Conselheiro
Lafaiete (MG) sempre “fucei” tudo que foi estrada vicinal , distrito, vilarejo
mineiro como ou sem jipes que uso desde o ano 2000 para poder alcançar os
recantos mais distantes e bonitos. Entre idas e vindas minha diminuta família
desde 1978 sempre esteve entre Lafaiete e BH e nesse período sempre me
espantou e ultrajou o crescimento da mineração ao longo da BR 040, da BR 262 e
muitos outras estradas e recantos que transformaram as Gerais num queijo suíço furado
milhões de vezes para alimentar de minério fornalhas chinesas e de outros
cantos do mundo. Vi as cercanias da
bela cidade de Belo Vale ( e tantas outras)destruídas, vi dezenas de acidentes
e para-brisas de carros quebrados pela irresponsabilidade e velocidade dos
caminhões de minério que acabam com rodovias federais e estaduais mantidas com o dinheiro público. As mineradoras são
as donas do pedaço, novas versões de um coronelismo truculento cheio de
máquinas pesadas que invadem espaços públicos e privados em busca de mais e
mais minério. Recentemente invadiram sem pedir licença a propriedade de
conhecidos do meu sogro em Ribeirão do Eixo, distrito de Itabirito.
Óbvio dizer que o “mar de lama” de Bento Rodrigues é a
crônica de uma tragédia anunciada. Metáfora perfeita para o Brasil inundado
pela lama político institucional. No meio disso tudo,pelos interesses que todos
sabemos, a a mídia evita citar nomes de empresas poderosas. E a
tragédia de Bento Rodrigues tem nome,
endereço e sobrenome. BHP Billiton, a maior empresa de mineração do mundo que
produz minério de ferro a partir de extração em Mariana e Ouro Preto, pela
empresa SAMARCO, em uma joint venture com a Vale S.A. Eles são os responsáveis.
A vilanice sempre tem rosto sim. Nós é que não mostramos.
Tudo isso dá um baita desalento . Nas
minhas incansáveis andanças por lindas trilhas mineiras cada vez mais
destruídas pela ganância da extração de minério vi inúmeras barragens em
terreno muito mais alto que vilarejos e cidades abaixo. Me lembro de Bento
Rodrigues mas não da barragem acima. Mas lembro de uma porção de outros locais onde barragens sujas e mal cuidadas oferecem perigo constante.
O que acontece , por exemplo, nas estradinhas que dão acesso de Ribeirão do
Eixo até São Gonçalo do Bação(nas cercanias de Itabirito) é um crime. Mas o que fazem os governos sejam
eles tucanos , petistas ou o que forem ? Nada . Nada além de contar mortos e
feridos e apresentar eternas e protocolares desculpas. É triste mesmo pois além
dos mortos ( ainda um número impreciso) tudo em volta foi e continua sendo destruído pelo rompimento da barragem. A
tragédia desce rio abaixo . Como diz o poeta Heitor Ferraz Mello “o
Brasil está calado, assistindo ao seu fim. O nosso fim, já que essas empresas
não vão parar a destruição, os governos desenvolvimentistas continuarão com sua
política cega (basta ver o fim do São Francisco), o agronegócio também não vai
deixar de enfiar soja em cada canto de terra que encontrarem. O Brasil morreu
nesta semana”. Poderia ser fatalista o que o poeta Heitor diz . Mas, pior , é
que não é. . Esse desastre não foi o primeiro do gênero. E quantos mais terão que ocorrer para que cessemos de perder o respeito ao ser humano ?
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