na rede, sem sargaços
(...)A esta altura já fico feliz se ao puxar a rede
eu traga peixes e não sargaços. Já fico feliz se a palavra não me abandonar, se
o parágrafo pronto não me abominar, se a felicidade de escrever não seguir
clandestina. Não quero ser um escritor de escritores. Talvez queira ser
escritor que serve refeições a muitos senhores,
que sirva um cardápio palatável a muitos paladares. Que seja até mal
julgado e avaliado mas que seja lido. Escritor que não quer ser lido que siga
escrevendo para o fundo das gavetas como na maior parte da vida eu fiz.
Estou meio deitado , meio sentado numa poltrona
verde. Lembra uma bergère , mais para reclinada, mais para cadeira de praia.
Tem um conforto sólido, acolhedor. Faz uma tarde nublada num dia de temperatura
amena de fim de novembro e aqui sentado vejo meus cães dormindo e a vida indo
ao redor de muitas folhas e algumas árvores que contornam um deque de madeira
lá fora. Tenho ainda alguns escassos e raros sonhos que conto nos dedos. Sonhos
poucos que escalam um pau de sebo. Subo, subo com eles e quando quase estou lá
em cima escorrego com eles cá pra baixo.
E começo tudo de novo, quase sempre, repetida e indefinidamente. Até onde me
levará tal jornada ? Não faço a menor idéia . Eu sempre busquei pelo inesperado
e a não ser que um raio agora parta uma ausente montanha estou cada vez mais descrente nas boas
surpresas. Se no meio do previsível eu conseguir uma micro-fatia de
imprevisível já me darei por satisfeito. Porque é muito ruim entrar em partidas nas quais já
sabemos de antemão qual será o desfecho.(...)
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