NA RÁDIO COM CACAREJOS E CIDINHA

     



    Penso cá , com meus desgastados botões, porque o rádio no Brasil, salvo honrosas exceções, virou fundamentalmente uma trincheira dos evangélicos pentecostais emissários das trevas e dos difusores do pior típico de música do sistema solar justamente em um país que tem na música uma das suas maiores trincheiras. 

    Isso posto digo que cresci ouvindo rádio e entre as lembranças mais caras de minha infância no ABC paulista está tomar café da manhã ouvindo o "Pulo do gato" ou  "O Trabuco" com o finado, contundente e lendário Vicente Leporace . Segui vida afora ouvindo rádio e até hoje a primeira coisa que faço ao levantar e descer para o café na cozinha é ligar o rádio. E isso, todo dia, acaba por ser motivo de desalento porque me pergunto sempre quando foi que nossas rádios , digamos, jornalísticas se transformaram num uníssono de âncoras medíocres com pensamentos únicos conservadores e piadinhas xexelentas diante de câmeras que agora tiram o saudável e saudoso ar de casulo que a rádio tinha diante da televisão.

    Como as grandes empresas, digamos, "jornalísticas" fazem parte de conglomerados midiáticos  hegemônicos era óbvio que não fossem dar vez  a vozes mais progressistas ou alinhadas à esquerda . Muito menos a anarquistas que remam contra todas as correntes. Nem eu seria tolo de imaginar que fariam isso. Mas precisa que todas elas só empreguem e deem espaço a conservadores das mais variadas faixas etárias cujo currículo invariavelmente é apenas vencer na vida dizendo sim ? É flagrante o despreparo, a pouca leitura , a pouca formação intelectual e humanista da maioria desses, digamos, "âncoras". Só isso explica em parte o sucesso dessa figura lapidar do opinionismo desenfreado que é Reinaldo Azevedo e seus cacarejos eloquentes ,um ex-extremista de direita agora convertido a simpatizante da justiça ao reconhecer que cometeram graves injustiças contra Lula.

    Talvez por ser uma pérola entre os porcos por ter lido livros capitais para a formação de qualquer jornalista o cacarejador se ache acima do bem e do mal e tem uma legião nada desprezível de ouvintes , imagino hoje formada por gente conservadora agora arrependida de seu voto em Bozo. Mesmo assim suas pílulas de sabedoria - que lembram aqueles recadinhos que existiam dentro das gotas de pinho Alabarda- e seu grasnar de tia véia ao tentar interpretar boas canções da MPB são acordes dissonantes diante de outros tantos âncoras rasos e ignaros. Isso não quer dizer que eu aprecie o estilo e modos do tal "tio Rei" mas seu estilo neo Trabuco de Leporace o coloca acima da média . Um horror menor diante de tantos horrores.

    Mas  toda essa peroração não é para falar do sujeito em questão e sim da falta de acordes dissonantes no rádio. A ausência total de diversidade de opiniões e visões sobre a vida dura que estamos levando. É preciso tolerar tanta opinião inútil e inócua, sempre a defender liberalismo, livre mercado, prospecção de negócios , empreendedorismo , enfim , a voz dos patrões, para ouvir notícias simplesmente. Por isso , graças a aplicativos , hoje sou mais é fã da veteraníssima e afiadíssima Cidinha Campos que das 13 às 15 hs rouba a cena na super rádio tupi do Rio de Janeiro. Embora não seja um farol de sabedoria é articulada ,contundente e crítica na medida certa em relação a abusos cometidos  pelos desgovernos dos quais somos reféns. Prefiro esse papo direto e reto do que as perorações enfadonhas de tantos comentaristas e âncoras enfadonhos.  

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