BORGES E O MAKSOUD PLAZA
Se tem tanta história ao redor do agora finado Maksoud Plaza eu peço licença pra contar a minha lá no QuarentenaNews.(POSTAGEM original, leia aqui)
BORGES E O MAKSOUD PLAZA
É
tanta história para contar, sobretudo por gente ligada ao jornalismo cultural
que, às vezes, dá impressão que o hotel Maksoud Plaza em São Paulo durou muito
mais do que os 42 anos em que esteve em atividade. Eu também tenho as minhas
histórias que talvez interessem a poucos mas mesmo assim registro uma em
especial : o meu encontro com o mitológico escritor argentino Jorge Luís
Borges.
Antes de mais nada é preciso dizer que
além do fato de ter recebido tantos hóspedes ilustres ou pseudo-ilustres nunca
vi nada demais no Maksoud Plaza seja como símbolo de São Paulo ou como
importância arquitetônica. Sempre o associei mais a uma certa “decadence sans
elegance” daqueles que moram em volta ou achavam aquilo tudo o suprassumo do
refinamento paulistano. Ou seja sempre achei o hotel muito mais brega do que
chic.
Isso posto entro num fim de tarde numa
mal iluminada sala do mezanino do hotel em agosto de 1984 quando eu era um
jovem repórter do “Caderno B” do “Jornal do Brasil” em São Paulo. Estava
prestes a ter um encontro exclusivo com um dos maiores escritores do mundo que
foi arranjado sei lá por quem a essa altura. Óbvio que o encontro foi concedido
pela importância do jornal que eu representava não por minha insignificância como repórter.
Levado pela vigilante Maria Kodama,
então esposa do escritor, sento-me diante dele que estava com o queixo posto
sobre as mãos que se apoiavan numa elegante bengala. Aliás Borges era todo
elegância ali , quase um estereótipo de um gentleman inglês do início do século
20.
Curiosamente eu não estava nervoso
diante de um monstro sagrado da literatura universal que se comportou com muita
polidez e a devida distância diante do
jovem repórter que trabalhava ali perto na sucursal paulista do jornal que
representava. Fui a pé ao Maksoud mas não para me jogar aos pés do mestre e sim
ter a absoluta certeza da mortalidade mesmo dos grandes ícones já que parecia a
aquela altura muito mais um fantasma de si mesmo. Ali diante de Borges eu estava dentro de um
conto de Borges especialmente quando ele disse com todas as letras “ que se
movia sempre entre uma espécie de fumaça azulada” fazendo referência a sua
avançada cegueira.
Não tenho nem a mais vaga ideia de onde
possa estar o recorte com essa reportagem- encontro de 1984 resultado do meu
encontro com Borges no agora finado Maksoud Plaza. E dele tiro a certeza de que muitas vezes
certos lugares se tornam sagrados não pelo que representam, mas pelo cenário de
encontros incríveis que proporcionaram. Geralmente encontros entre grandes
artistas e cientistas com voláteis
repórteres que erram quando imaginam ter a mesma importância que seus
entrevistados. Mas fica o registro que embute perfeitamente o conceito de São
Paulo “que ergue e destrói coisas belas” e foi criado por Caetano Veloso outro
ícone com quem partilhei uma tarde de boa prosa e Coca- Cola no agora extinto
Maksoud Plaza.
Ricardo Soares é escritor,
diretor de tv, roteirista e jornalista. Publicou 9 livros, dirigiu 12
documentários.
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