Não é cartão postal

 Só mais um jeitinho de falar sobre São Paulo...publicado originalmente no Quarentena News(clique aqui)


NÃO É CARTÃO POSTAL

São Paulo
Meu São Paulinho de janeiro a dezembro
Minha cidade desandada
minha patriazinha mal amada

Aqui não estão mais teus poetas desatentos

Para dizerem que te amam

Porque te amar é tão difícil

Pretenso túmulo do samba,

Cidadona cheia de entulho e de bueiros

De enchentes e vidas mal calçadas

Te amar desde que havia garoa

Desde que a vida era boa

É um desafio constante

Mas te amo mesmo assim

Com suas ladeiras e ausências de alpendres

Com teus pães bem feitos e tuas pizzarias

Com tuas fomes, medos e engarrafamentos

Com a lápide de Mario de Andrade e

Com semanas de artes não modernas

Onde engolimos sapos, ratos, baratas e bactérias

Fumaças das marginais

 

Vamos te amando mesmo assim

Amor remoto desde o pátio do colégio

A uma revolução de 32

Ou um grito remoto às margens do Ipiranga

Vamos te amando com teu perfume barato

Suas conduções repletas

Uma garoa e um nevoeiro que agora só paira na imaginação

São Paulo meu São Paulinho do ano inteiro

 

Beleza perdida de um fevereiro despedaçado

Que vem do meu coração que na verdade te espelha

Então é um amor leite condensado

Doce mas que faz mal

E assim se cria amor descompensado

Amor quitinete, amor bala na agulha

Amor que de dois lados é preciso cuidar e ser cuidado

Eu, por mim , dele cuidarei

Desafiarei tempo e espaço

Voltarei à infância macarrônica

A infância arroz- feijão

E vou levar o meu e o teu coração

Tão desvelado

Um coração de romanceiro de toda inconfidência

Para amar meu São Paulinho

é primeiro preciso muita paciência

 

Ricardo Soares, 30 de janeiro de 2022- Granja Viana

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