Por que seguir escrevendo ?

         




Por que seguir escrevendo ?

 

Chega uma hora em que você chega a conclusão de que por mais que escreva ou goste de escrever não há mais quem espere pelos seus textos e você mesmo para de esperar alguma coisa deles. Então, por que seguir escrevendo ?  Nessa malta de tantos autores que se espalham pelas redes, no muito joio misturado ao pouco trigo , na profusão de professores e influencers que “ensinam” a escrever e a ler, por que continuar a escrever ?

O maior paradoxo desses dias é que nunca vi tanta gente ruim publicar tanto livro ruim (por pequenas , médias e grandes editoras) num país que não lê quase nada, proporcionalmente falando. Sequer assimilamos as últimas gerações  não perdidas ( do Dalton Trevisan, Rubem Fonseca, Sérgio Sant´anna , Oswaldo França Jr. , João Gilberto Noll, Márcia Denser,Paulo Leminski, para citar apenas alguns) e chegam aos vagalhões todos os dias verdadeiras avalanches de novos autores que , segundo o mercado, devem ser lidos e notados.  Aliás se eu fosse dono de editora dava a ela o nome de “Avalanche” diante de tanta oferta de autor para pouca procura de leitor.

Esse texto pode ser falta do que fazer ou simplesmente palavras ao vento de um autor outsider que no fundo crê que deveria ser mais notado , mas é peixe estragado. Mas é, sinceramente e mais uma vez, uma tentativa (vã?)  de voltar ao mesmo assunto. Para que se publicar tanto e sem o menor critério embora paradoxalmente eu concorde com o poeta e editor (Patuá) Eduardo Lacerda que assegura que  todos tem sim o direito de publicar , especialmente os escribas mais novos, que ainda não tiveram as “ilusões perdidas”.

Não há ensaios a respeito, a crítica literária praticamente inexiste no Brasil e muitos escribas morrem de medo de por o dedo na ferida. Mas, se escreve muito e mal no nosso país hoje em dia. Principalmente porque os que estão chegando não leram o que foi feito antes  deles e se apresentam como “renovadores” quando são apenas sócios de um museu de velhas novidades.

Nunca vi tanta gente ávida por Jabutis, Oceanos e marés de prêmios fazendo descaradamente campanhas para serem premiados sem se preocupar de fato com o que estão escrevendo. As editoras vivem fazendo listas de autores e livros fundamentais dos “hoje em dia”. Mas nada, quase nada, passa na real pelo crivo da qualidade. A literatura brasileira contemporânea é um deserto de tártaros onde uma porção de soldadinhos ficam esperando para ver o que vai acontecer tal qual o clássico do Dino Buzzatti.

Estou a dizer isso porque perdi a relevância  se é que um dia a tive ? Não, faço desapegado mesmo. Clamando para que os escritores olhem mais para o entorno e menos para seus umbigos. E não se iludam. Tive livro que vendeu a beça ( como o infanto juvenil “O Brasil é feito por nós ?” ) e livro que recebeu boa crítica e poucos leitores como o  romance “Cinevertigem” ( Record 2005)  mas , nesse caminho literário, a vida vem em ondas como o mar. Estar “por cima” numa temporada não quer dizer que você não vai tomar um “caldo” na temporada seguinte.Disso tudo tiro o seguinte : queria eu ter a metade da autoestima dos autores ativos e passivos da nossa combalida literatura que se acham a última maizena do pacote quando  não passam de quirera bichada.

Sim, há três estágios de eliminação na vida como diz um texto que corre ( sem autor ) pela internet : “aos 60 anos, o local de trabalho elimina você. Não importa o quão bem-sucedido ou poderoso você foi durante sua carreira, você voltará a ser uma pessoa comum.Portanto, não se apegue à mentalidade e ao senso de superioridade do seu trabalho anterior, deixe de lado o seu ego, ou você pode perder a sua tranquilidade!”. Para mim isso cabe como luva.

         Passei anos e anos escrevendo e divulgando literatura por todos os meios possíveis. Os cães ladraram, minha caravana passou e agora resta a esperança de que o tempo faça o seu tempo e separe   e conserve o que de fato faz diferença. Por isso repito o mote inicial que é uma dúvida : paro ou continuo ? por que seguir escrevendo ?

 

( Ricardo Soares, 7 de julho de 2024, Granja, 15 h 54 min)

 


Comentários

Jaime Guimarães disse…
Ricardo, continue escrevendo porque há muitas coisas a serem registradas e sobretudo continue escrevendo para que tenhamos textos de qualidade.
Ricardo Soares disse…
Jaime Guimarães , grato pela seu sempre presente incentivo...grande abraço
Cassionei Petry disse…
Sempre lendo o nobre autor. No dia 25, Dia Nacional do Escritor, vou publicar no jornal da minha cidade e no meu blog um texto sobre ser escritor. Abraço.

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