Aos 60 porque fugi para a Córsega


     
    Aos 20 anos (um pouco mais,um pouco menos)viajava pelo Brasil e América do Sul mostrando a dura realidade dos caminhoneiros nativos pelas rotas múltiplas e já perigosas que cortam o continente. Primeiro pela revista " O Carreteiro" - editora Abril-  depois pela Boléia - Bloch Editores - e sempre levado pela mão amiga do meu padrinho profissional o finado e saudoso Marco Antonio Souto Maior. Desse período fértil , imaginário repleto das figuras de um Brasil que eu desconhecia, ficaram amigos queridos que me acompanham até hoje como Walterson Sardenberg Sobrinho que eu apelidei de "Berg" (pegou!) e Rosane Pedrosa de Andrade que acabei de visitar na Córsega. O Marco já partiu assim como Tadeu Nogueira grande amigo daquelas ocasiões que nos deixou órfãos de sua superlativa simpatia.
         Aos 40 anos ainda publicava livros infanto-juvenis com assiduidade e acreditava  numa literatura que pudesse ser feita  fora das regras do "deus mercado" que só dá holofotes a lançamentos e gente que sabe mais do que escrever valorizar a sua - muitas vezes- torpe mercadoria. Nessa idade também fazia um programa de televisão chamado "Literatura" e por conta dele recebi mensagens generosas de gente do naipe do falecido jurista Goffredo Telles Junior uma coluna jônica do conhecimento jurídico brasileiro que Marreco Moro não deve sequer saber quem é. Foi por achar hoje cedo na estante o seu livro "A Folha Dobrada" que resolvi escrever essas mal traçadas lembranças.
         Agora o tempo passou na janela e os meus olhos mal viram e cheguei aos 60 mês passado. Quis passá-los longe daqui por motivos óbvios ou nem tanto. Meu raciocínio enviesado disse : "se você nasceu em pleno governo de JK, às vésperas da inauguração de Brasília, quando o país experimentava um otimismo crescente é muita sacanagem virar sexagenário num país desgovernado por Bozonazi , o pior entre os piores da história republicana com o país experimentando um pessimismo e desalento crescente".    
         Eis então que fui-me embora para a minha Pasárgada particular que ficou ali nas cercanias de Bastia e Saint -Florent com pulinhos em outras cidades corsas como a própria Ajaccio, a capital local. Aí , para completar a dose, uns 10 dias de Paris que eterniza sempre a máxima de Humprey Bogart em Casablanca : "sempre haverá Paris".
        Eia, pois, advogado de minhas próprias causas perdidas, que volto e para além dos dias lindos que tem feito olho em volta, além da minha casa e meus cachorros, e vejo que aos 60 os horizontes profissionais se estreitaram, os caminhos não se bifurcaram e muitas das "causas" que abracei como comunicação pública e jornalismo papo reto estão mortos ou respiram por aqueles velhos e bons aparelhos como prova a saga de Glenn  ao revelar a podridão Marreca que já intuíamos.
         Não tenho a menor vontade de me aposentar e nem posso ainda mais agora com essa "reforma" espúria. Também não tenho mais a menor paciência para o termo "reinvenção" e nem para a tsunami de coachs manés que pululam como pipoca feita de milho ruim e transgênico. Assim sigo coçando os olhos para saber se tudo que está à minha volta é produto de delírio coletivo, dimensão paralela ou realidade mesmo. Tento morder meu cotovelo mas não o alcanço. Mais uma das utopias que ficam longe. Assim,me perdoem, deu uma baita saudade de entrar naquela "Boléia" na qual embarquei aos 20 anos. Não, a velhice não liberta.

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