NA CACUNDA DO LAGARTO

HOMENAGEM TARDIA A UM AMIGOMuitas vezes nesse modesto blog pensei em falar da pousada Vale das Cachoeiras do meu amigo Cláudio Faviere lá em Cunha, interior de São Paulo. Pensei em colar um link para o site da Pousada, para as histórias dele...não sei nem mais porque não o fiz ou porque fui adiando. Talvez porque inconscientemente não quisesse divulgar um recanto aprazível que me dava tanta paz. Talvez eu tenha sido egoísta.Fato é que noite passada o Cláudio morreu e eu tardiamente deixo aqui o link para o seu paraíso e um texto que funciona como despedida ? funciona ? não sei ... sei apenas que tudo isso me deixou triste e desesperançado. E o recado ao Cláudio eu divido abaixo com vocês...Cláudio. No principio chegamos sozinhos e sozinhos nos vamos. Não lhe parece assim? A vida , ou o fim dela, não é assim ? Ainda outro dia falávamos sobre o que poderia ou não ser feito. Uma horta deixada de lado, um livro inacabado , um amor não vivido. Não sei se você agora está só ou acompanhado do outro lado e nós dois por certo iríamos rir da obviedade que é fazer um obituário, um necrológio de um amigo querido. Ora , e quem diria que eu iria fazer o seu ? Quem diz inclusive que isso é um necrológio ? Na verdade esse é um discurso sobre o possível e não sobre o viável. Um discurso sobre o óbvio e não sobre o impalpável.
Segunda -feira passada passei pelo trevo de Guaratinguetá e Cunha . Vinha da região de Cabo Frio e na Dutra, apesar da longa viagem, eu estava desperto e resolvi dormir em casa . Não desviei até sua pousada pois não imaginava que na sexta você pediria a conta e iria embora. Aliás as contas todas que o afligiam ( da pousada e da vida) agora ficaram para trás. E para trás ficaram os originais do seu livro ' Na Cacunda do Lagarto' que eu não sei de que jeito estavam. Concluído ou ainda por mexer ? Provisório ou definitivo ? Sei apenas que o objetivo primeiro de você deixar o jornalismo de lado foi para mergulhar na feitura dessa história que permanece inédita. Vou procurar saber dela e por onde ela anda. Talvez nossos amigos em comum possam me ajudar. Aqueles que como eu sentem a sua falta: Cley Scholz, Duarte, Lalo, Zezo Cintra, Tania Celidonio, Luizão Guerrero ,o Fabião aí de Cunha.
Cunha aliás passou a ser das minhas cidades preferidas por sua causa e por causa de sua Pousada Vale das Cachoeiras. Agora pousada e cidade perdem a graça para mim pois será insípido e inodoro estar aí sem poder desfrutar de nossas longas conversas sobre literatura, jornalismo,família e a vida. Eu não esperava que você fosse tão depressa e nem adianta agora eu ficar aqui me penitenciando por não ter passado na segunda-feira em sua pousada. O tempo se esvai mesmo . Quando vimos já foi. Cunha agora foi em minha vida. As suas cachoeiras ainda ficam por aí indeléveis , testemunhas de vidas idas e vividas. Na verdade o que sinto nem é tristeza . É uma profunda e sólida melancolia. Foi-se um amigo , foi-se um recanto aprazível, um paraíso possível. As 16 horas de hoje você foi sepultado. Em Cunha. É quase certo que o carrilhão da igreja matriz da cidade não tenha dobrado em sua homenagem. Mas que você merecia, isso merecia. Você adorava essa cidade e muitos de nós aprendemos a amá-la por sua causa. Para mim esses são os homens que merecem uma estátua. Aqueles que amam e veneram o lugar que escolheram viver e morrer. A sua não será erigida. Mas está fincada na minha memória como uma cruzinha de um tardio descobrimento. Você e sua pousada muitas vezes me devolveram a paz que eu sempre persegui. Descanse.

Comentários

Anônimo disse…
Queria ser a primeira a comentar a sua gostosa homenagem ao Claudinho. Naquela hora que você me ligou senti um profundo pesar, mas agora meus olhos marejaram. Cheguei a lembrar nitidamente do café da manhã na pousada. Do cheiro daquele pãozinho de ervas, do Claudinho sempre muito carinhoso em tudo que fazia naquele recanto. Assim como você me apeguei muito ao Vale das Cachoeiras e ao Claudinho. Aquele lugar faz parte da nossa história. Vou sentir muita falta também. Pelo amor de Deus tenta mesmo saber como ficou os escritos do "Na Cacunda do Lagarto". Acho que você e os amigos mais íntimos devem recuperar isso. Beijos, meu amor.
Unknown disse…
Minha ida em 2007 para o Vale das Cachoeiras foi, em princípio, para que o Claudinho terminasse o livro "Na Cacunda do Lagarto". Deveria eu cuidar da pousada e ele das escritas. Livro este que vi nascer, durante o tempo que dividimos a mesma casa na Vila Olimpia, primeiro quando ele comprou o sítio e veio com a idéia do livro e depois os primeiros rascunhos. Minha estada lá no Vale não resultou numa linha sequer a mais naquele livro.
Cheguei a relê-lo e comentei mais de uma vez com o Claudio que ele devia terminá-lo. Bem, a teimosia do nosso amigo e seu apego e carinho à pousada impediu que o livro andasse. Mas tenho a impressão que uma revisão e uns ajustes já estariam de bom tamanho. Infelizmente não tenho cópia do livro, mas vou pedir ao Mingão, seu irmão, que me envie cópia assim que puder.
Grande Abraço
Sofia disse…
Este comentário foi removido pelo autor.
Sofia disse…
sinto muito pela sua perda, que suas forças possam ser renovadas!
A saudade prova que algo no passado valeu a pena, então quando a dor passar e só a saudade ficar, as coisas ficarão mais claras e as memórias mais leves! =)

Obrigada pela visita à Casa da Mãe Joana!

Um beijo,
Sofia
Sofia disse…
ps: sobre seu comentário: concordo! haha
mas para não criar confusão, digo que SP e RJ têm belezas diferentes! =)

um beijo!
Juvenal disse…
Ricardo
Ontem liguei para seu celular. Estava fora de área. Depois a operadora mandou um recado automatico dizendo que voce ja estava na ativa e tb não consegui completar. Vai um recado no blog. Como voce tem assunto! Que diversidade. Lembro de um encontro nosso com o Paulo Coelho na Rua Augusta. Eu não dava bola para ele e depois li um livro O Alquimista. Gostei.
Atualmente, entre sonhos, projetos e o o dia-a-dia - ocupo parte deles acompanhando e fotografando o que rola na Camara Municipal de Sampa. Politica é uma coisa inteligente e sofisticada. Como na vida. Tem bons e maus. Me defendo em Cecilia Meirelles: "Não acuso nem perdoo. Distingo". Quando dá viajo pelo patropri prourando imagens para completar o meu projeto de livro: Brasil, meu olhar enternecido. Espero publicar proximamente.
Obrigado pelo recado no meu blog. Ele tem tão poucos leitores que um como você vale este montão de palavras de agradecimento.
Juvenal Pereira
d@ny disse…
A missa de 7º dia do Claudio, será na Capela de Cunha, neste sábado (28/02) às 19 horas...Seria ótimo se os amigos pudessem comparecer...Abraços! Daniela Hidaka
Anônimo disse…
Prezados, informo a todos que a POUSADA VALE DAS CACHOEIRAS, está sendo administrada pelo irmão do Cláudio (DOMINGOS FAVIERE). Segue o telefone para contato caso queira obter informações sobre o livro. Telefone (12) 3111-1998
Anônimo disse…
Na cacunda do lagarto.

Um lagarto relâmpago relampejo,
de cores e amores rastejantes,
que empoeirava caminho,
saracoteou na frente de Claudinho.
Claudinho esfoliador de letras encomendadas,
das laudas prontas como fabrica de salsichas,
nem pensou e num instante grudou lagarto
passante como passageiro errante.
Na Cacunda do Lagarto misturou o seu destino,
fundiram perna corpo intestino,
os rabos emendaram e inventavam no caminho.
Na Cacunda do Lagarto ia Claudinho,
feito vaqueiro na caatinga,
no galope pra o Vale das
Cachoeiras de Cunha, no Valar do espinho.
No vale valores viraram tambores
antes rugidos intrinsecamente,
agora com Claudinho Na Cacunda do Lagarto
tambor soava com alarde valente.
Tudo Claudinho fazia Na Cacunda do Lagarto,
comia cedo jantava, dormia tarde cedo acordava,
escrevia livro e poetizava, rabiscava o passado
e o futuro fumegava.
O lagarto tirou o tarugo da cidade e jogou pro sertão,
deu lhe vida de lagarto a serpentear no chão.
Agora lagarto foi pra um lado e Claudinho foi pro outro,
diametralmente opostos, profundamente indigestos,
antecipadamente insólitos.
Tirar Claudinho da cacunda do lagarto é o mesmo
que tirar lagarto da cacunda do Claudinho,
que coisa mais antiga é a morte,
que coisa mais tardia é a vida.

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