Pêndulo no escuro



Eu seria o esmo
se não fosse o pródigo

pródigo se não fosse o último
último se eu fosse o primeiro

primeiro se eu me reinventasse
derradeiro a sair da classe
na dianteira de perder o bonde

Onde jaz o tempo perdido ?
no pé de couve do seu ouvido
no anel que tu me deste
no doce que me roubaste
na inflexível haste que resiste à dor dos anos

Os pernilongos escavam minha cidade
e eu coço o cimento rude
que se dissolve em tanta água parada

Eu seria o ponto de chegada
se soubesse quando parti

o último será o derradeiro
derrotado mesmo pelo primeiro
porque o mundo não premia as fábulas

Eu seria o esmo
não fossem as uvas
seria um cordeiro
não fossem as raposas

Seria um pródigo não fosse um filho
seria um atalho não fosse um rombo
seria um trajeto não fosse um corte
seria a sorte não fosse o azar

segundo se eu me reinventasse
outrora perdendo a classe
jubilando a lição
minha mão vindo antes da fala
a fabular o passado
um dado que tem um só lado
um olhar enviesado
uma cisma de relógio
um pêndulo no escuro
disposto a romper o muro...

Ricardo Soares. Madrugada de 27/11/2009

Comentários

gentil carioca disse…
Esse é o meu Ricardo...
Lindo.
Estilhaço dos 70 disse…
Esse é o nosso Ricardo minha cara gentil!! sem medo de mostrar o lado lírico escondido atrás do espírito crítico. Ele deveria ser mais desavergonhado com a sua poesia e publicar de novo. Adorei.
Nossa! Já que foi postado em 27 de novembro, vou considerar um presente de aniversário inconsciente, ok?...
Lindo! Parabéns (e obrigada!...rsrsrsrsrs)

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