SOB A MANCHA DE ÓLEO...

Eu broto do meio da marginal congestionada
a fina flor da maçada paulistana
a criar galhos entre os edificios
e os trens cheios que partem para Francisco Morato


Eu broto do meio da minha própria dor de dente
a não me importar com direitos autorais
ou sambas de breque do Bixiga
porque de noite não rondo a cidade a lhe procurar


Eu broto do meio do afalto quente
a me alimentar do sangue dos motoboys encardidos
que perecem todos os dias nas fronteiras da sarjeta


Eu broto
eu frutifico
nao sou estéril
me multiplico
em meio às borracharias
e a tantos calendários obscenos
que não marcam os anus plenos


eu sou uma praga rasteira
uma erva daninha
uma porção da louça portuguesa
quebrada pelos nossos avós


sou a poesia dos Pinheiros
a meditação do Tietê
a onda do Tamanduateí
sou a serra do Japi


Eu erro, eu errei
não era para estar aqui
mas compareço à toda chamada
afinal é a São Paulo desalmada...


a terra que descarna o meu coração
o meu avesso do protesto
meu insensato manifesto modernista


me solapou o homem, a mulher
mas não destrói o coração do artista
assim é , pois, se lhe parece


o gesto fica
a ação prossegue
e eu broto assim
insensata sensação que permanece...




                                                                       ***


Ricardo Soares, 21 de junho de 2010, "acordando"

Comentários

Marly Ramos disse…
Ahhhdorei...O Avesso do avesso passado a ferro. Muito bom, menino. Muito bom.
Ka disse…
Você "acorda" bonito" :)

gostei muito...
inclusive do "assim é se lhe parece". Acabei de ler Pirandello. amo.

beijos
Momentos... disse…
"insensata sensação que permanece..."

Adorei...

Um sorriso.

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