Cinema como terapia para o desapontamento

Ontem descobri mais uma utilidade para o cinema. Terapia para o desapontamento. E no caso um desapontamento colossal pois quando ele vem em relação a quem a gente admira pessoal e profissionalmente aprendi que é muito pior do que em relação a pessoas de quem a gente nada espera.Ontem, por  mais que não me deixe abater, fui nocauteado por um desapontamento peso pesado em relação a uma pessoa da área audiovisual. E descobri, ironicamente, que a melhor maneira de curar um desapontamento audiovisual é com audiovisual. Desnorteado ,atônito ,até indignado por ainda não ter digerido o "upper" entrei em sessão dupla "road movie" para fazer hora até um jantar com dois amigos queridos que tentaram me consolar em relação à decepção audiovisual.


Pois foi assim. Entrei no UNIBANCO sala 4 aqui em São Paulo para assistir "A Prova de Morte" o mais recente Tarantino e daí pulei para a sala 5 e mergulhei no "Viajo porque preciso volto porque te amo" filme brazuca  de Karim Aïnouz e Marcelo Gomes.Dois "road movies" diametralmente opostos e igualmente estimulantes. Um com uma rotação tão alta que poderia estourar potentes caixas acústicas (no caso do filme de Tarantino) e outro numa levada quase minimalista se me permitem o uso do desgastado termo que até Philip Glass repudia.
Se não achei redenção total pra meu desapontamento ao menos sai mais leve da sessão dupla por perceber que cinema continua sendo território livre para a ousadia, a falta de medo, a coragem de trilhar caminhos ainda não percorridos.Nesse ponto a saga "B" de Tarantino tem pontos de convergência com o trabalho de Karim e Gomes. Cada qual, na lentidão contemplativa e sem história linear do "Viajo porque preciso" à frenética corrida de imagens do novo Tarantino ousa,incita, busca,provoca. Não é uma receita para quem tem medo de filmar ou de assistir.  
Se eu disser que apenas recomendo esses filmes poderia ser muito simplista. Eles de certa forma são mais do que recomendáveis.São a prova viva de que o cinema respira e abraça (para o bem e para o mal) diretores que não temem e que se guiam por bússolas que mesmo desorientadas apontam para algum lugar. Ontem aprendi mais uma definitiva utilidade do cinema. Sai feliz das sessões. Se não foi um alumbramento serviu para abrandar o meu desapontamento.

Comentários

Ricardo Soares disse…
não! não! não!!! de novo e de maneira irreversível cometi um erro fatal na administração de comentários e deletei cinco deles que deveria ter mantido...eram lindos e me faziam aumentar meu alento com meu desapontamento... eram de Fabrício Carlos, Dona Urtigão, Ser Pai, E.Campos e a Gisele... ao menos lembro de quem eram... que erro triste cometi... chego a pensar em não mais moderar comentários por conta disso... gente, será que vcs podem tentar devolver as lindas palavras que aqui deixaram ??? eu só medio os comentários de um tempo pra cá por conta de virus que entram quando os deixo livres... que pena gente... beijo terno de dia dos pais pra todos que aqui me afagaram...
Sergio disse…
Hola Ricardo,

no te preocupes... sucede!

Acá estoy de nuevo... y listo!

Pues me alegro que el cine te haya servido para aliviar tu desilusión con quien te decepcionó tanto!

Pero, aún así, sigue confiando en las personas, porque quien sale perdendo son ellas..., no tú!

Mira el resultado de tu dose dupla...:=)!

Te dejo saludos argentinos,

Sergio.
olá, amigo
Eu não penso com a razão, penso com o coração e certamente não saberia agora escrever o mesmo que havia escrito, mas algo como: há muuuitos anos passados assisti a um filme, um bang bang onde o personagem dizia que só somos traidos pelos nossos amigos... e isso marcou-me.
Quanto ao título do filme que vc indica, eu disse que caso tivesse capacidade de fazer um, seria "viajo porque amo, volto porque preciso" e completava desculpando-me pelo meu atabalhoado comentário, porque estava em um dia excepcionalmente ruim, (ou talvez, rotineiramente atrapalhado, complemento hoje)
abraço
Edu Campos disse…
Recebi teu recado sobre o comentário perdido (All the lost commentaries...). Eu não estou muito certo, mas acho que só tinha concordado com o que você escreveu, cinema engole a gente. Mesmo na TV, filme sempre foi um bom remédio, cê escreveu certíssimo.
Só deixei de falar mal do Tarantino, que acho um picareta infantilóide e deslumbrado. Divertido, claro, mas descartável.
Spike Lee, sim, é relevante.
Estive assistindo "The 25th hour", no DVD. Cara, quase não consegui dormir. E só de me lembrar da cena com o 'ground zero', em NY, fico arrepiado. Perturbador.
E aquele lindo 'poema' - Foda-se Nova York -, que Edward Norton recita ao espelho ! Aquilo não vai dar pra esquecer.
Spike Lee é uma espécie de apanhador no campo de centeio. Ele não quer que ninguém caia no abismo. Então mostra o que tem lá.
Continue firme. Teu exemplo é bom.
Dá pra derrubar muita coisa com a internete e aquele estranho FaceBurca. Quase ninguém percebe, mas você fica tentando mostrar.
Tanto mais já fizeram com um simples mimeógrafo !
Mas o terreno, hoje, é o pior possível para ser semeado. Qualquer cristão está à venda por uma tela de plasma.
Ainda assim, melhor ter alguma faísca que fogo nenhum.
Abraço.
Edu
Adriana Marques disse…
"Viajo porque preciso..." é interessante, se pensado como um paralelo entre o caminho árido e desnorteado que as relações amorosas, quase sempre numa rotina de estrada longa, nos persegue sempre. Quase que um documentário visual sobre cidades à beira de estrada e sua população, que parece nunca estar ali - sempre de passagem, quase que um sonho, um filme. Embora monótono, e volto a falar sobre uma possível metáfora sobre a monotonia nos relacionamentos, esse filme me fez pensar muito sobre a comunicação entre as pessoas - a solidão do protagonista (e a nossa própria - eu me senti solitária na sala de cinema assistindo a esse filme, talvez pelo "desapontamento"...) que sequer mostra sua cara; e embora de levada "minimalista", como você descreve, me mostrou o antagonismo da inquietude de pessoas que estão sempre indo, sem nunca sair do lugar.

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