Rio : milhares de "cobradores"

   
     Da série de pragas urbanas que assolam o planeta qual será maior que a violência  que grassa,consome,dilapida, detona e destroe nossos corações e mentes ? o Rio de Janeiro virou o retrato disso (e não só o Rio) no seu paradoxo de belezas e contradições, a cidade partida do Zuenir, a cidade acuada, a cidade com medo mas que nem por isso perde seu charme, rebolado de cidade pra fora, cidade civilização solar de Fausto Fawcett, morada eterna de paulistas, mineiros, capixabas inzoneiros que a eternizaram como o imortal Rubem Braga.
    Rubem Braga , vivo fosse, não estaria clamando apenas o "Ai de Ti Copacabana" mas "Ai de ti Rio de Janeiro" que chegou à era dos extremos de uma civilização tropical acuada pela miséria, pela usura,pela lei da vantagem, por aquele dogma perverso de que quem vale mais é aquele que mais tem na crua lógica da civilização hegemônica globalizada que nos ensina que consumir é existir, possuir é poder .
    Portanto por mais que se combata o tráfico, as drogas, os papelotes, a cocaína ou as baganas o que corroe o Rio, o que corroe o Brasil não é apenas a contravenção. É a lógica da existência como um shopping center ambulante onde vale mais quem tem mais. Os que tem são os bons, os encaixados, os queridos, logo, os alvejados. E os que não tem vão querer ter . E aí cobram forte, cobram com força , com raiva, com desprezo pelos que tem. A solução não está em Rubem Braga mas na estética do protagonista do cruel conto de Rubem Fonseca, o clássico "O Cobrador" . Vejam:
"...rua cheia de gente. Digo, dentro da minha cabeça, e às vezes para fora, está todo mundo me devendo! Estão me devendo comida, buceta, cobertor, sapato, casa, automóvel, relógio, dentes, estão me devendo (...) Tão me devendo colégio, namorada, aparelho de som, respeito, sanduíche de mortadela no botequim da rua Vieira Fazenda, sorvete, bola de futebol".

  É isso. Alguém sempre deve pra alguém e é cobrado. O Rio tem sensações de satisfação pedagiadas. Tudo custa. Tudo é dificil, tudo é caro aos que não tem e querem ter. O que está sendo colocado em xeque não é apenas um problema do crime contra a legalidade. Das drogas licítas contra as ilícitas visto que muitas vezes as estratégias contra o pó são regadas a porres de bom uísque. Deixemos de hipocrisia. O que está em xeque no Rio como em outras tantas cidades do mundo é um modelo de civilização. O "Planeta Favela" ( para usar aqui uma feliz expressão de Mark Davis) avança velozmente deixando seu rastro de sangue, ódio, vingança , egoísmo, sexismo, hedonismo para trás. Avança, preda ,embora sigamos todo dia a alimentar esperanças. E assim deve ser. Mas não nos iludamos. Porque crescem todos os dias em proporções epidêmicas os exércitos de "cobradores" que ainda vão descer muitos morros e favelas a cobrar o que lhes devemos. E devemos muito.

Comentários

Cotidiano disse…
Devemos pela omissão não?,pela passividade.
Cotidiano disse…
Devemos pela omissão,pela passividade de um povo !cordial".tenho inveja dos argentinos e seus panelassos

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