REFLEXÕES AO REDOR DO MINHOCÃO

   Depois de tanto tempo, depois de um final de ano cheio de emoções baratas (ondas de tristezas e alegrias em cascatas), depois de me questionar sobre as indefinições da vida e as paisagens improváveis eis que me vi hoje ali pelas cercanias do Minhocão, na esquina da general Jardim com a Amaral Gurgel, perto também da avenida São Luis, edificio Itália, Copan, biblioteca Mário de Andrade, praça dom José Gaspar, rua major Quedinho , inclusive a degustar o antológico e lendário sanduíche de pernil do bar do Estadão.
   Depois de tanto tempo estive por ali rondando ressabiado a minha cidade que busco de novo reconhecer, amar , me reintegrar num flerte muito sem graça como se possível fosse recuperar um amor antigo desgastado pelas mazelas do tempo e pelo desgaste das relações. São Paulo me maltratou tanto e eu tanto maltratei São Paulo que agora não nos reconhecemos embora tantas vezes na vida tenha feito declarações de amor a ela em crônicas de jornais, televisão ou mesmo a esmo debruçado nas mesas dos seus bares, restaurantes ou nas suas varandas poluídas a revelar cenários improváveis.
   Entre as tarefas do dia entrei numa sala do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo onde homologuei um contrato de trabalho de ano e pouco atrás. Adiei a decisão em fins de 2009 pois me sentia lesado pela empresa contratante e me mandei pra Angola. Agora ou o conformismo ou a precisão me fizeram capitular e espero o bom senso da empresa para me pagar o que deve. Como são tediosas essas questões práticas que empanam o pouco brilho que ainda resiste nessa cidade de tantas luzes e brilhos questionáveis.
   No meio dessa tarde ali naquele canto do centro achei São Paulo com um trânsito até que tolerável , fruto talvez desses dias de férias. Vi vendedores sonolentos sentados em cadeiras antigas, senhoras gordas com as mãos postas sobre as barrigas e entrei num sebo na major Quedinho onde matei parte da tarde a buscar dvds baratos. É possível sim peneirar um pouco de alegria em meio a tanta tristeza na paisagem. Ainda mais quando encontra-se uma amiga querida ( que trabalha ali no Diario de S. Paulo) que entre lembranças antigas e os cigarros que ela não larga me advertiu que não podemos esmorecer diante das tristezas desses tempos bicudos. Quando nos despedimos com um olhar fraterno é como se disséssemos um ao outro que estamos “condenados” a essa cidade e dela não vamos nos livrar. Acho que ainda arrematamos dizendo um ao outro “feliz 2011”. Mas se não dissemos é como se tivéssemos dito. Afinal entre eu , essa amiga e São Paulo certas coisas não precisam ser ditas. São intuidas.    

Comentários

Lindo ( emocionante) texto.
Feliz 2011.
Pratos de Ouro disse…
Olá a todos os que vão ler este comentário neste blogue ou noutro muito bom como este. Pois é, estou encantado com todos estes pratos tão bem confeccionados. Pois, eu gostava de fazer igual, mas não consigo. A vida é dura e obrigou-me a morar sozinho, e a cozinha não é de todo o meu local favorito. Mas estou a tentar conhecê-la, mas as aventuras têm sido imensas. Fiz um blog humilde para colocá-las em forma de crónica pouco extensas. Gostava muito que todos vocês o visitassem e se possível o seguissem. É que tentar cozinhar e depois não ser ajudado, é algo muita mau.
Cumprimentos a todos!

http://tenhosalfaltamecolher.blogspot.com/
Meu caro Ricardo
Belo texto, como todos os que você está nos brindando. Gostaria de acrescentar apenas a saudade da Biblioteca Municipal Mário de Andrade, onde passei ótimos momentos em minha juventude e onde conheci minha companheira. Queria escrever minhas mulher, mas isso hoje é considerado politicamente incorreto, já que a expressão "minha mulher" dá um sentido de posse. Minha esposa então, nem pensar. Fico por tanto com minha companheira e mãe de meus tres filhos.
E para que não haja dúvidas, estamos juntos há 44 anos.
Uma vida e bem vivida.
Caríssimo, que 2011 nos dê uma pequena folga para que possamos completar o nosso trabalho.
Um grande abraço.
Ricardo,

Que neste 2011 você continue a exercitar o dom de identificar acidez onde muitos (míopes) veem beleza e a extrair palavras agradáveis de momentos cujo cenário, ao fundo, não apresenta nada além do triste Elevado.

abraços,

Fernando Salles
Ricardo Soares disse…
comentários como os feitos aqui é que ainda inspiram e motivam a gente a seguir com um blog...obrigado aos queridos Bourdoukan,Joel, dona Urtigão,Fernando Salles e outros tantos e tantos leitores que conheço e não conheço pessoalmente... isso gera gratidão, gratidão gera gentileza e filosofia de botequim conforme o exposto no post acima desse " A solidão dos blogs"... um post inspirado por esses belos comentários aqui deixados... e um feliz 2011 a todos...
Helô Müller disse…
A solidão é uma companheira fiel, Ricardo!

Adorei seu texto e me identifiquei demais com ele!
Resisti a ter um Blogue, mas por insistência de minha filha, acabei cedendo. Sempre achei que poucos se interessariam pelos "nossos escritos"... E, até hoje, penso assim! - As pessoas têm preguiça de ler mais de 3 linhas, já notou? rs - Mas, como tb "escrevo porque preciso", sinto minhas necessidades atendidas, assim como "devidamente arquivadas"; já que através do Blog, podemos manter o nosso "arquivo pessoal"! ( pelo menos pra mim, é claro! )
Eu não optei, como vc, em só escrever o que for de minha autoria... Incluo textos e poesias de diversos poetas - e sempre preservando a autoria - que fique bem claro! ( coisa rara no mundo Blogal! )
O processo de criação, na seleção das mais belas e adequadas imagens às poesias por mim escolhidas, me dão um imenso prazer, mesmo que solitário...
Portanto, sigamos viagem!! rs
Bj
Helô

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