Paul Theroux e uma África precisa

Paul Theroux: que tenha longa vida para escrever muitos mais livros de viagens
           "A vontade de desaparecer faz muita gente viajar". Só por essa precisa definição já valeria a pena ler  "O Safári da Estrela Negra" magistral livro de viagem de Paul Theroux que,se levarmos em conta o que escreve,  deve ter gostado de desaparecer desde sempre visto seu gosto por viagens heterodoxas  e sua acuidade na observação de costumes, gestos e pessoas. 
      Livros de viagem são um gênero fascinante desde sempre mas também podem ser tediosos quando o narrador preocupa-se muito mais consigo no contexto do que com o texto em volta da geografia. Theroux, como bem observa uma citação do Observer sobre sua obra  "permanece o padrão pelo qual se julgam os outros livros de viagem".
          Apesar de renomado e reconhecido nunca prestei maiores atenções ao Theroux além do interesse que me despertou seu trabalho a partir do filme "The Mosquito Coast" baseado num livro de sua autoria com Harrison Ford de protagonista. Muitas vezes Hollywood vende errado o peixe e , vagamente, imaginei  um Theroux viajante glamourizado que observa o seu entorno com luvas cirúrgicas como alguns fazem inclusive aqui no Brasil . Sucede que Theroux quer ser um anônimo na multidão, pega ônibus e trens sórdidos e perigosos África adentro nesse livro onde você sente os cheiros do que ele escreve. Rara habilidade que não é nem um pouco empanada pela tradução que julgo ser boa embora não tenha conhecimentos gramaticais suficientes em inglês para julgar o trabalho de Paulo Afonso, o tradutor.
       "O Safári da Estrela Negra" foi publicado entre nós pela editora Objetiva e saiu nos Estados Unidos há quase dez anos, resultado de uma longa volta ao continente africano do autor que ali viveu , inclusive como professor no Malaui por dois anos. Theroux não tem piedade de si próprio pelas dificuldades que enfrenta no livro e nem poupa a quem observa. Não julga, apenas constata com uma crueza desconcertante. É humanista em cada linha muito embora o observador apressado possa julgá-lo racista num primeiro momento. 
          Conheço pouco a África tirando três meses de Angola e 15 dias de África do Sul. Mas do pouco que vi e ouvi andando por lá me parece próximo às sensações que Theroux nos descreve. Logo mais em abril ele fará 70 anos de muitos livros, muita ficção e muita memória. Que tenha saúde e garra pra viver muito mais. Theroux é um autor que vale a pena nesse universo literário tão asséptico e bem condicionado dos tempos virtuais. Pelo menos esse seu livro é uma tempestade de areia e não uma paisagem vista da janela de um avião .     

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