O Céu acima das canas

O céu acima das canas

Caminhar através de dias iluminados/ não são mais tempos nublados/
e resistir às corizas que passam e aos ventos que varrem

o tempo esparrama minhas lembranças/ minha mãe escorre dos armários
e as mãos que me embalaram batem em revoadas, almas aladas

meu pai estoura uma esferográfica no bolso e se lambuza de torresmos
dirige devagar na via Anchieta com os caminhões que fazem as vezes de bondes

uma represa aparece em nossa frente e os pássaros, tão pássaros sequer cantam
há algas na água
há madeiras na margem
há afogados clamando por resgate
há casas que ficaram no fundo
mas é só meu pai emergindo das lembranças

na verdade caminhar em dias iluminados/não são mais tempos nublados
é enxergar o que estava aqui e não se via
é na verdade tirar toda a sujeira da pia
destampar ralos, comer tremoços com as mãos
torrar amendoins , se fartar de cachaça

o céu está acima das canas
as canas acima do chão
meus pés fincados na terra
os sonhos ( ainda) ao alcance da mão

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