ETERNIDADE NÃO É UM FIM EM SI MESMA

      

    Num dos pontos mais próximos das dificuldades em que pudemos ver os caminhos guiados estavam uns espécimes na verdade parecidos com guardas florestais. Quepes redondos, ridículas bermudas  de brim quase até os joelhos pareciam ter saído de algum filme de colonização britânica na Índia pré Mahatma Gandhi. Caminhos guiados induzem a guias. Mas ninguém podia ter certeza se eram mesmo guias ou eles próprios estavam perdidos naquela sinuosidade de tempo espaço perdido.
     Não podíamos começar de outro jeito. O mais certo era saber se o jeito era encarar uma daquelas trilhas que eles guardavam desde a entrada. Eles não diziam se podíamos entrar. Se entrássemos não diziam se podíamos sair. Se ficássemos ali nas entradas dos caminhos íamos derreter ao sol inclemente.
       Quisera naquele momento ter alguma vocação para cronista de viagens. Para lhes explicar as nuances de cheiros , clima, calor, sabor. Sim, o ar tinha sabor. Pimenta , curry, coco, arroz integral, lentilha. Tudo misturado e eu assado. Sentia minhas virilhas arderem , a carne de minhas coxas toda assada pela longa caminhada onde friccionadas e untadas pelo suor elas despelavam numa prova inconteste de que eu não era dali.
       Que guerra é essa que lutamos ? que guerra é essa que eles lutam ? afinal por que nos odiamos ?  se me perguntassem de bate pronto, aqui e agora, não saberia dizer. Só sei que também no meio desses campos que sequer sei se são de batalhas há , também, uma guerra de perfumes. Sândalo, lavanda , breuzinho, tantos cheiros bons a inebriar  nossos sentidos acalorados.
       Um silvo, uma sirene, um abrupto estranhamento. Todos estancam. Nós que íamos entrar num dos caminhos, eles que guardavam aquelas entradas.  Quietos, todos nós. Podíamos ouvir nossas próprias respirações. O que estava posto estava posto. O que ia acontecer era o mistério . Um leve e crescente ronronar de motor fazia-se  ouvir ao fundo do cenário quente. Parecia algo que estava chegando. Mas que não chegava. Só deixava a expectativa da chegada.  E vai crescendo, crescendo, crescendo. 
   Corta o céu um risco forte. Quem espera o tocar de trombetas se decepciona. Na verdade, nem tambores rufam. Entre nós que queríamos entrar em um dos caminhos e eles que nos guardavam surgiu uma lenta de procissão de homens cujos pés não tocam o chão. Carregavam enormes estandartes multicoloridos dos quais desconhecíamos os significados. Não vinham em fila mas lado a lado. Como se iguais todos fossem. Não nos olharam nos olhos e acabaram por passar entre nós. Assim ficamos e estamos desde então , suspensos no tempo, sem saber para onde vamos. A eternidade deixa de ser um fim em si mesma.


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