FLAGRANTES ANÔNIMOS DO MOMENTO PRESENTE (1)


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FLAGRANTES ANÔNIMOS DO MOMENTO PRESENTE (1)

      Tenho 65 anos sou corretor de seguros e estou inseguro.Nunca fiz da aposentadoria um projeto de vida mas diante das circunstâncias me preocupo. Apesar de não ter seguido nenhuma carreira reluzente como muitos de meus contemporâneos eu acabei me instruindo por conta própria. Não virei advogado, juiz e nem funcionário público. Não me tornei gerente de banco , consultor financeiro nem médico de clínica particular. Tive sempre vida e opções modestas.
         Há dez anos perdi minha companheira com quem não tive filhos. De nossa união ficou uma casa mal paga e sem reformas, um cão velho e sem dentes e o amor subitamente interrompido depois de mais de 30 anos de casamento. Da viuvez não me queixo . Com a solidão não me importo. Mas temo pelo cenário em volta.
         Estamos no ano de 2016 e só vejo conquistas sociais há muito sonhadas escoarem para o ralo. Alguns dos meus velhos companheiros de escola me chamam de socialista, comunista ou mesmo bolivariano que é um termo da falsa moda que eles cunharam. Enriqueceram nos ditos governos que eles atacaram e derrubaram  e dizem que o país vai ficar muito melhor agora. Não tenho opinião formada sobre isso . Só sei que um deles sonega fortemente imposto, o outro deve rios de pensões alimentícias e um terceiro tem uma penca de títulos protestados. Mas todos soltaram rojões quando saiu o impeachment da senhora presidente.
         Quisera ter eu grandes expectativas de futuro aos 65 anos.Mas me sinto plácido. Nem plácido, aliás . Parado, estagnado , olhando a paisagem deteriorada por grandes espigões aqui em volta da casa modesta onde moro.  Toda noite faço uma sopa diferente  e como com um pedaço de pão italiano torrado e um cálice de vinho barato. Não brindo a nada. Só a vida que continua. Esticada ao limite da tolerância e da paciência. Não ligo televisão, não navego na internet. Me recosto numa velha cadeira de leitura de boa cepa, de bom e cinqüentenário couro, estico minhas pernas para que meu velho cão deite-se sobre elas. Abro um livro  ao léu em qualquer página e sempre tiro algo que preste dos autores que amo. A vida vem sim condensada em palavras. Delas não espero a redenção. Só que me dêem um alento para esperar por dias melhores que não sei se virão.


Comentários

Anônimo disse…
Fala Ricardo! Confio que todos nos tenhamos condicoes de chegar muito bem aos 65... ativos e sem sopa todas as noites ;-)

Espero que esteja tudo certo por ai. Grande abraco! Arthur

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