CANECAS ANTIGAS

 


CANECAS  ANTIGAS 

Andei, viajei, acumulei xícaras e canecas, amigos e desafetos, poentes e ausentes, discos e rabiscos e cheguei, conformado, ao degrau da irrelevância absoluta o que nos dá a dimensão de não abandonar a luta mas sim a certeza de que tudo é possível arriscar. Afinal é a idade de não temer mais nenhum ridículo, de estender lençóis manchados e o coração partido para visitação pública.

Amei quem não devia, deixei quem não merecia, relevei e vivi com gente que não gostava de poesia e nem de cachorros o que no fundo é a mesma coisa. Recebi cartas antigas e muitas não respondi o que agora não é possível visto que alguns destinatários já foram para as terras dos pés juntos. E nesse contexto, ainda hoje, tantos anos passados, tenho a ligeira impressão de que não disse tudo que devia ao meu pai e minha mãe e me penitencio por ter acreditado em miragens e ter deixado escapar entre os dedos tantas emoções baratas.

Ainda agorinha acho livros manchados pelo tempo com marcadores antigos mostrando onde parei de ler um dia. Agora não adianta retomar porque sou outro e o melhor é doar esses livros para que cumpram seus destinos de não serem lidos por outros olhos.

Creio ter perdido alguns mapas, quebrei alguns objetos que venerava e sigo olhando para trás, contemplando o caminho percorrido, tentando achar nele não o meu futuro mas somente o tempo que eu suponho perdido. 

Ricardo Soares, 14 de outubro de 2021

Granja Viana, Carapicuiba, Sp

 

 

Comentários

Elisabete Cunha disse…
É a chuva molhando, limpando, irritando e purificando os ciclos da vida!

Nunca mais tinha comentado no seu blog...
Velhos tempos, novos tempos..o tal ciclo.
Elisabete Cunha disse…
*irrigando

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