A SAPUCAÍ DE NOSSAS VIDAS

               


                     A SAPUCAÍ DE NOSSAS VIDAS

 

Bom dia. Parou de chover um pouquinho e eu parei também um pouco de chover no molhado sobre essa questão de envelhecer que pode sim ser um processo complexo de perdas que vão dos cabelos à mobilidade, da relevância à visibilidade. O Guimarães Rosa dizia que viver é perigoso e eu, a essa altura da vida, digo que envelhecer é perigoso porque no processo tem o que eu posso fazer por mim, mas tem a sociedade da imagem que odeia gente mais velha. Ou parece odiar como andamos vendo por alguns episódios de lamentável etarismo que a mídia noticiou.

            Bom dia. Para de chover, a gente abre a janela e vê que o melhor do desfile da Sapucaí de nossas vidas já passou, mas, convenhamos, o desfile ainda não acabou. Há alegorias que ainda não foram contempladas e apesar do júri não nos ser simpático pode , com alguma sorte, ver ainda graça nas nossas evoluções, nosso mestre-sala , nossa porta bandeira que tem que ser levantada todos os dias para que a gente não sucumba.

            As paisagens da infância e da adolescência , algumas delas, ainda permanecem quase inalteradas apesar de maltratadas, limo crescendo entre as escadas , frestas, corrimões e vias de acesso a dias mais jovens. Alguns de nós amarram-se a postes para não sermos levados pelas más correntezas. E quando sorrimos nos preocupamos mais com os dentes que estão ficando feios e amarelos do que com a transcendência do sorriso. Hoje estou aqui, menos chuvoso como o dia de sol, para não dar tanta  bola para a enxurrada de lembranças. Confesso que não é fácil. Mas, como dizia o poeta Neruda, confesso que vivi. E da melhor maneira que pude até agora.

Ricardo Soares, 17 de março de 2023

           

           

Comentários

asperando disse…
que lindo texto!
confesso que ando perdida em reflexões sobre os melhores momentos da minha vida (que nunca foram tão melhores assim) e em quais ainda podem existir.

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