MEU DESAPREÇO INFANTO- JUVENIL

                            




    MEU DESAPREÇO INFANTO-JUVENIL

 

Não é sempre , mas quem escreve às vezes é dado a transcrever o que pensa alto, a esmo, na busca de si mesmo. Quando penso alto poupo meus escassos leitores de tais digressões, mas a que narro agora achei que pudesse ter algum interesse visto que eu mesmo não tenho resposta para a pergunta abaixo.

        Por que parei de escrever para o público infanto-juvenil justamente o nicho onde mais livros vendi e fui publicado por editoras grandes?  Agora, mais cedo, fiquei me perguntando sobre a questão que nunca tinha me incomodado. Seria uma desilusão com o mercado, que só divulga e festeja a “novidade” ? Seria a profusão de livros e autores ruins no gênero? Seria a mercantilização do segmento com autores virando mascates de seus escritos? Pode ser isso tudo e um pouco mais, um pouco menos.

        Fato é que diante do abissal derramamento de livros infanto-juvenis no mercado, quase todos ruins, pueris e mal escritos fiquei refletindo que falta autocrítica e crítica especializada para a maioria dos autores e autoras. Também falta critério editorial pois se publica muito mais joio do que trigo e isso é deplorável num país que tantos talentos teve na área a começar do prolífico e eterno Monteiro Lobato.

        Afinal, depois dele, o que faz mesmo a diferença? conta-se nos dedos : Ruth Rocha, um ou outro livro de Ana Maria Machado, a nonagenária Lygia Bojunga, Ricardo Azevedo , o finado Marcos Rey, Luciana Sandroni, Domingos Pellegrini, Adriana Falcão , João Carlos Marinho, José Roberto Torero, Sylvia Orthof, Ziraldo, Francisco Marins. Esse último, por exemplo, completamente esquecido.

        Essa lista pode ser controversa, mas, talvez, existam poucos nomes além desses.  O critério de publicação agora parece ser mercadológico e a régua que mede autores ( não só na área infanto-juvenil) é aquela de incensar os mais capazes de “fazer amigos e influenciar pessoas” além , é claro, dos que são “premiados” com os Jabutis da vida. A maioria muito ruins o que denota, também, a pseudo- qualidade dos jurados.

        Se a vocês parece que estou tecendo raciocínio ressentido sobre o assunto eu esclareço. Comecei muito cedo minha, digamos, “carreira” no infanto -juvenil. E com um livro publicado pelo finado Caio Graco Prado na coleção “jovens do mundo todo” da outrora prestigiada editora Brasiliense.  O livro se chama “O Brasil é feito por nós?”  e está em catálogo até hoje publicado  ( vigésima edição) pela editora Atual que parece ter sido incorporada pela SM Educação.

        Esse livrinho me deu muitas alegrias e é passado numa São Bernardo do Campo durante a copa de 1970 e mostrava a contradição entre o país imaginário ( vendido pela ditadura militar) e o país real de lares com pais desempregados. Era e é um livro anti ufanismo e ao que consta vendeu mais de 60 mil exemplares. Outro que vendeu dez vezes menos e foi relevante para mim foi “Valentão” publicado pela editora Moderna que o retirou do catálogo recentemente apesar do assunto bullying estar mais atual do que nunca.  “Questões do mercado” me explicaram sem explicar. A se notar que algumas editoras, incorporadas por grandes grupos internacionais, veem como primeiro requisito para manter um livro no mercado o seu poder de venda. E nada mais.

        Além dos dois livros que citei publiquei “Franguinho Sebastião”, “Dia de Submarino” ( o meu preferido) e “Falta de Ar”, todos fora de catálogo como bem convém a um autor bissexto e relaxado. Afinal sabe-se que para ter uma “carreira” nessa área é preciso publicar em quantidade , deixando a qualidade em outra prateleira. Há dezenas de exemplos disso , mas não vou citar autores ruins .

        Se o texto acima pareceu cabotino me perdoem. Não quis dizer que cometi uma literatura infanto – juvenil de primeira linha. É só para tentar responder , eu mesmo , porque me desinteressei pelo tema como autor ou leitor. Publiquei pouco, leio cada vez menos infanto-juvenis e me pergunto se há saídas para esses becos num país onde se lê pouco e mal e tem a concorrência de tantas redes sociais e plataformas de dancinhas e vacuidades. Dias piores virão?

ps .  O texto acima é apenas uma digressão sobre a literatura infanto-juvenil brasileira. A de outras plagas é outro assunto.       


    


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