Jornalismo cultural :Glórias passadas, apreensões futuras

      



    Jornalismo cultural :Glórias passadas, apreensões futuras

 

         Admito que é infinitamente pessoal o depoimento  a seguir, talvez tosca tentativa de entender o que aconteceu com o jornalismo cultural no eixo Rio- Sp nos últimos 40 anos. Estou atônito entre as minhas , digamos, “glórias passadas” e irrelevância atual que embute apreensões futuras.

        Se me exponho agora é com a ciência do meu diminuto tamanho diante do assunto. Mas, por outro lado, o faço com certo gosto na medida em que leio não raro depoimentos de sessentões como eu que se atribuem uma importância que nunca tiveram. Ao menos imagino a esta altura conhecer o meu devido lugar.

        Sem medo de ser impreciso e com receio de cometer injustiças vou logo avisando que vou citar nomes. Pelo menos os meus nomes. Quando iniciei na profissão demorei cinco anos até alcançar meu objetivo que era atuar no jornalismo cultural. A primeira chance real foi pelas mãos de Zuenir Ventura que editor do Caderno B do Jornal do Brasil lá no Rio de Janeiro botou reparo no jovem repórter da sucursal paulista que fazia com gosto reportagens culturais desde São Paulo. Elas agradaram ao já veterano editor que certa feita resolveu mandar um “telex” ( vejam só, é do tempo do “telex”!) para a minha “chefa”  solicitando que eu me encarregasse exclusivamente a partir dali das reportagens do caderno B em Sp o que não era pouca coisa para aquela época e para  o jovem jornalista de 24 anos que eu era.

        Nada foi como antes. O holofote em assinar muitas matérias de capa para o extinto “caderno B” me valeram muitos outros convites profissionais posteriores como tomar parte da equipe fundadora do “caderno 2”  e , indiretamente depois, ser convidado para redigir e apresentar o programa “Metrópolis” da tv Cultura.

        Glórias passadas, apreensões futuras, tive bem mais do que os meus 15 minutos de fama, entrevistei e reportei sobre assuntos culturais a valer .Tive a oportunidade de estar perto dos protagonistas na área durante vários anos. Gente de cinema, teatro, artes plásticas, visuais e literatura o que me valeu também convites para resenhar livros para vários veículos como os extintos “Jornal da Tarde” e “Leia Livros”.

        Antes de toda essa epopeia aprendi lendo muita gente boa no segmento  e até invejei alguns deles por terem um espaço que eu não tinha. Poucos deles seguem na seara até hoje como o Sérgio Augusto. Mas no caminho ficaram- por inúmeros motivos – profissionais como Isa Cambará, Ligia Sanches, meus amigos Sérgio Pinto de Almeida e Maria Amélia Rocha Lopes, Pepe Escobar, Paulo Francis, Tarso de Castro, Nelson Merlin, Jary Cardoso, Nirlando Beirão, Wagner Carelli, Osmar Freitas Jr., Joaquim Ferreira dos Santos, Artur Xexéo, Artur da Távola, Gilberto Vasconcellos e poucos outros mais. Dos que vieram um pouco depois de mim guardo registro dos (ainda na ativa) Jotabê Medeiros e Tom Cardoso.

        Toda essa pueril digressão não é para me abraçar ao meu rancor embora possa parecer. É para constatar o quão ralo, minguado, aguado e mal escrito é o nosso jornalismo cultural de hoje em dia com raras exceções cometidas por alguns textos na elitista revista “Piauí”.

        Sinto-me muitas vezes como o capitão Ahab, (do magistral romance “Moby Dick” de Herman Melville) um velho de barba grisalha , sempre em vigília no convés de um antigo navio para observar um oceano que agora desconhece. O jornalismo cultural , afinal, é findo ou será que sou eu que já vou indo ?

 

Ricardo Soares, 23 de janeiro de 2025  

Comentários

Anônimo disse…
Enquanto ele existir na nossa memória, ele é vivo. O Neoliberalismofaz de tudo para exterminar a Cultura, em órgãos públicos, no cotidiano das pessoas. Eu acompanhei boa parte da sua trajetória e te afirmo que seus textos sempre dialogadas e/ou questionavam e traziam novidades para o meu trabalho e formação cultural. Essa formação que é contínua e vibrante, apesar da falta de eco numa sociedade amorfa e doente.
Anônimo disse…
A anônima é a Ana Lúcia Brandão. Cresci numa família nuclear em que líamos todos os citados, trocávamos impressões, adquiriamos livros indicamos e tal.
Ricardo Soares disse…
Anônima "Ana Brandão"...felizão por vc vir comentar no blog pois hj em dia poucos fazem isso...tudo se resume aos comentários nas redes sociais, mas até porque sou mais analógico que digital fico insistindo por aqui...e a insistência vale a pena por comentários como esses seus que reconhecem alguma relevância nos meus escritos idos e vividos...muito grato pela gentileza...kiss
Ricardo Soares disse…
viva a sua família nuclear que indicava livros!

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