MUITOS INFERNOS

      

MUITOS INFERNOS

É célebre a frase do estupefaciente escritor argentino Jorge Luís Borges que diz imaginar o paraíso como uma espécie de grande biblioteca. Quanto ao inferno suas versões   vão muito além dos círculos imaginados por Dante Alighieri em sua “ Divina Comédia”.

         Como temos profusões de infernos em muitos lugares do mundo vamos nos circunscrever a algumas versões brasileiras que eu jamais imaginaria na minha infância e juventude quando começava a apreciar literatura de horror e fantasia e seus mestres Poe e tantos outros.

         O Brasil desse primeiro quarto de século 21 virou uma profusão de infernos contínuos e diários e não há benzimento que pareça dar conta disso. Quem poderia supor que todos os dias, quando acordamos, somos atropelados por uma série de más notícias e indigências verbais de todos os matizes e uma violência contínua e epidêmica que nos leva celulares, carteiras, alianças e nossas vidas ?  Tudo edulcorado por sermões de falsos pastores estridentes e mercenários cujo altar é voltado apenas para o deus dinheiro.

         No meio disso atletas e “influenciadores” (os muitos emissários do demo nas redes sociais) fazendo apologia de apostas em bets e jogos de tigrinhos e tigrões cujos patrocinadores desfilam carrões, ouros e ostentações enquanto a malta que esse lixo consome segue se espremendo em trens , metrôs e ônibus superlotados.

         Aí toda a trilha sonora desse inferno é feita do mais puro lixo sertanojo com suas duplas cabeçudas e hediondas a balirem dejetos pseudopoéticos, música  agro ogro do país. Aquela malta que pede a deposição de quem foi legitimamente eleito, torce pela manutenção do trabalho escravo e/ou mal pago e dita uma moda de chapeludos que confundem o Texas com o interior do país.

         Tá bom para você ou quer mais? Pode somar a isso a  trilha do funk ostentação , as unhudas sujas que desfilam lingeries e sexualizam os jovens desde muito cedo ou ainda o desfile diário de ignorância explicita promovida por arautos dos falsos valores ou fascistoídes políticos a quem só interessa a eterna divisão brasileira entre os poucos ricos e os muitos excluídos.

         Nesse tempo é difícil se manter de pé. Difícil não se sentir excluído , minoria ou o escambau.  Difícil não mergulhar na distimia, na  alegoria mais que nunca melancólica de uma minoria , aquela que acredita em justiça social, igualdade, fraternidade, abraços e ombros amigos.

         Já disse por aqui que creio que Cérbero, o cão que guarda as portas do inferno, tem sido incompetente porque passou muito mais que uma boiada de demônios nesses últimos anos. Do vampiro Temer ao chupa -cabra Aócio a ladeira só foi abaixo. Que me perdoem os anjos e arcanjos, os cultores do otimismo namastê , os e as gratiluz contemporâneas , mas não sei de dou (damos) contas de tantos infernos nesses nossos dias de apocalipse nada ligeiro.

Ricardo Soares, 27 de agosto de 2025, 11 e 25 min

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