TEMPO DOS AMUADOS
TEMPO DOS AMUADOS
Chegou o “tempo dos
amuados”, termo pueril que cunhei nesse instante para definir uma legião de colegas e amigos de
profissão que precocemente foram colocados à deriva no mercado , sobretudo por
questões etaristas e, por consequência , do mercado que quer carne fresca
e cordata, plenamente afinada com os conceitos
tecnológicos e reducionistas que permeiam a lógica do jornalismo atual.
Não se trata de
saudosismo puro e simples. Ou , talvez, se trate. Fato é que vejo tal quantidade
de profissionais de bom quilate por aí a deriva que chego a crer que se juntos
estivessem comporiam a melhor redação do Brasil. Gente por volta dos 70, 60
anos e até menos. Assim é se nos parece.
Todo esse introito foi
para justificar o que vem agora : falar dos “nossos” primeiros tempos
profissionais. E esse texto foi motivado por conta de outro , escrito por um
colega do passado, José Augusto Ferraz, que comemorou 45 anos de “jornalismo de
transporte” evocando uma publicação onde estivemos juntos no começo dos anos 80
. A “ Boléia”, a revista do caminhoneiro , publicada pela Bloch Editores para
concorrer com a “clássica” “O Carreteiro” , publicada pela editora Abril de onde
viemos eu e o finado e querido Marco
Antonio Souto Maior que me adotou nos meus primeiros tempos. O Zé Augusto veio
logo depois.
No “Carreteiro” fiquei de
1978 a 1980 (eu tinha 18 anos quando lá comecei!) e de 1980 a 1982 fiquei na “Boléia”.
Quatro anos iniciais na profissão que me permitiram
bater perna e comer poeira pelas estradas do país e da América Latina se for
levar em conta uma longa viagem pela rodovia Pan Americana, cortando Argentina,
Chile e Peru. Com perdão do clichê foi nessa lida que aprendi a conhecer o
Brasil real, o tal “Brasil profundo” termo pedante cunhado por quem nada
conhece do país.
O texto do Zé Augusto me
fez olhar pelo retrovisor e misturar sensações e lembranças que se misturam em
quase meio século de profissão onde só no nicho “revistas” trabalhei e escrevi,
como colaborador, empregado e chefe para
muitas delas. A maioria extintas como as já mencionadas e outras mais como “Manchete”, “Ele&Ela”,
“Caros Amigos”, “Leia Livros” e outras vivas – algumas cambaleantes – como “Rolling
Stone”, “Trip”, “ Marie Claire” e outras . Mais de vinte se for contar revistas
corporativas para clientes grã-finos.
Lembrar tudo isso por
certo me inclui na lista dos “amuados”, aqueles que evocam os dias melhores que
já se foram. No entanto, como poderia se esperar, não me envergonho de nada
disso. Só constato que as revistas se extinguem e que “as coisas” mudaram para
pior. Por certo me dá alento poder segurar a mão de muitos desses “colegas
geracionais” e compartilhar boas lembranças . Podemos ser amuados, acuados ,
mas não derrotados. Para cada Jaguar que parte ficam dúzias de alienados e
cordatos. Mas isso é outra prosa.
Ricardo Soares, 25 de agosto de 2025
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